O melhor deste livro está na notável diagnose da vida política e intelectual russa de meados do século XIX. Ao menos, é este o nível que me parece mais bem resolvido no livro; não deixa de ser um cenário para a história de amor – que de resto termina muito civilizadamente, sem cataclismos... – que conduz a narrativa, mas um cenário pintado com tintas magníficas pela verve do autor.
«À volta da árvore russa –
à l´'Arbre russe – reuniam-se normalmente os nossos simpáticos compatriotas; vinham altivamente, negligentemente, elegantemente, à moda, cumprimentavam-se majestosamente, elegantemente, familiarmente, como compete a seres que se encontram no pináculo da cultura moderna. Mas, depois de se encontrarem, já sentados, decididamente não sabiam o que dizer uns aos outros, e caíam na tagarelice triste ou na fala barata, vulgar, e nas anedotas extremamente impudicas de um ex-literato francês, antiquado, falador e palhaço, com uns miseráveis sapatos judaicos nos pés e uma pequena barba desprezível na face ignóbil.» (p. 8)
Fumo Ivan
Turguéniev
216 pp
Tradução a partir do russo e Notas de Manuel Seabra
Relógio D'Água Editores
Lisboa, Fevereiro de 2010
Ivan Turguéniev nasceu em Orel, no Império Russo, em 1818. É considerado uma das figuras mais importantes da literatura russa, ao lado de Dostoiévski e Tolstoi. Oriundo de uma família abastada, passou a infância em Spaskoe, onde conheceu de perto a vida no campo. O seu livro
Pais e Filhos (1862) deu origem a grande controvérsia, o que fez com que o autor abandonasse a Rússia. Depois de viver em Baden-Baden e em Londres, fixou-se nos arredores de Paris, onde faleceu em 1883.
Sugestões de Leitura:
Pais e Filhos
Ivan Turguéniev
256 pp
Traduzido do russo por António Pescada
Posfácio de Vladimir Nabokov
Relógio D'Água Editores
Lisboa, Maio de 2007
O Crepúsculo do Amor [sobre a vida de Turguéniev]Robert Dessaix
266 pp
Tradução de José Lima
Oceanos
/ASA Editores
Lisboa, Fevereiro de 2007