sábado, 24 de agosto de 2013

Ipsis litteris

«É corrente a crença de que os sentidos antigos das palavras são mais verdadeiros do que os atuais. É um caso específico do mito da língua perfeita, que teria existido em algum momento, em algum lugar. A crença explica o sucesso de livrinhos sobre a origem das palavras.
Ora, nunca se poderá descobrir o pretenso sentido original. Não se pode ir ao início dos tempos. Sempre há o limite dos documentos. A pesquisa deve se deter em um momento dado da história, que não é seu início. Além disso, em geral, descobre-se que então os sentidos já eram muitos...
Apesar de tudo, a crença permanece. Um de seus efeitos menos inteligentes é certa mania recente de ‘corrigir’ as interpretações correntes, atuais, populares. A tendência ataca indistintamente expressões idiomáticas, textos populares e provérbios, entre outros.(...)»


Muito bom artigo, que vale a pena ler completo AQUI


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

a língua e muito mais

«(...) a língua não baixou do céu dada por Deus ou pelos deuses, que ela é fruto humano. Perfeito. O único problema é que a ideia de arbitrariedade passou a ser confundida por alguns com vale-tudo: se tudo é convenção, tudo pode ser mudado. Ora, vivemos de convenções de todos os tipos e achamos normal respeitá-las, porque foram feitas para isso, mas as da língua são altamente questionáveis aos olhos de muitos. Por que essa sanha? Por causa do seu valor simbólico.» (do blogue de Ivone Benedetti)

Vale a pena ler o texto completo AQUI e dar uma espiadela no blogue A Grenha.

 

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

recordar "Cem Anos de Solidão"

Desenhos de Carybé para o livro.

«Arte por meio da escrita é o que fez o colombiano Gabriel García Márquez em sua obra definitiva, Cem Anos de Solidão. Construiu a história latino-americana tão repleta de guerras e solidão a partir da árvore genealógica de uma família.

A América Latina é uma região diferenciada do mundo — quanto à história da construção de sua identidade. As instabilidades políticas, aliadas à insuficiência de recursos, muito contribuiu para a eclosão de movimentos típicos da alma latino-americana: ditaduras, guerras, guerrilhas, repressões, exílios e exportação de refugiados são fatos próprios de nossa história. Uma história de solidão, como bem definiu um de seus maiores intérpretes. Na visão desse intérprete, isso se deve a um nó que evidencia “a in­suficiência dos recursos convencionais para tornar nossa vida acreditável”.

Esse mesmo intérprete delineou, com a inteligência que lhe é peculiar, o perfil inerente ao
continente latino-americano. Continente que revela o muito que tem de demente, mesmo  após a libertação do império espanhol, que por anos dominou a maioria dos países latino-
americanos. Trans­crevamos parte de um discurso desse intelectual, quando do 
recebimento da maior honraria que um homem de letras pode receber neste mundo: o Prêmio Nobel de Literatura.»


Link pra o artigo completo: AQUI


segunda-feira, 5 de agosto de 2013

tradutor poeta ou poeta tradutor?

Link para o texto completo: AQUI

«Se a obra de arte é o meio onde podem ser encontradas as respostas para as indagações da sociedade, o modernismo respondeu ao século 20 trocando a simetria pela irregularidade, pelo contraste, pela dissonância, pelo efeito do imprevisível e inesperado. Embora tivesse implícita uma democracia que não exigia que suas inovações fossem adotadas com exclusividade, dando espaço, também, àqueles que utilizassem os padrões fixos. É nesse cenário que surge Manuel Bandeira. Poeta modernista brasileiro, que chocou a sociedade com o poema “Os sapos” na Semana de Arte de 1922. A irreverência, a ausência de rimas, os elementos inesperados de construções metafóricas, os temas sociais em evidência são características marcantes da poesia de Bandeira.»

O parágrafo acima pertence ao texto de Cristina Patriota: «Manuel Bandeira: tradutor poeta ou poeta tradutor?»


Manuel Bandeira, poeta e tradutor, um dos mais
importantes autores de Língua Portuguesa. 



Os Sapos

Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.

Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.

Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.

O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.

Vai por cinquüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.

Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."

Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei!"- "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".

Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.

Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".

Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".

Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;

Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é

Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...


terça-feira, 30 de julho de 2013

a força das crônicas nascidas na rua (durante as manifs no Rio)

«Tem a Mídia Ninja, a grande sensação dos meios de comunicação, a TV que transmite por telefone diretamente de onde o pau estiver quebrando, e tem a partir deste momento, aqui também pela internet, a Crônica Ninja.

É aquela que enrola a camiseta na cabeça dos bons modos de redigir, deixa de fora apenas os olhos de ver a emoção nas ruas, os narizes de respirar o vento das almas carregadas de gás lacrimogêneo – e vai transmitindo o que sai aos borbotões pelo coração, pela veia quântica da jugular. Tudo na certeza de que a edição, o pensar duas vezes, a pontuação escorreita, tudo que não for ao vivo e de primeira acaba frio como aquele prato de dobradinha fria que o Fernando Pessoa comeu como vingança quente em algum poema que a Bethania deve ter lido num show dos anos 80.

A Crônica Ninja, esta que agora aqui se vos apresenta digitalmente, liga a tecla F e sai mostrando o que antes não devia ser visto porque, diziam os técnicos, não tinha qualidade ou não era o que estava na grade. A Crônica Ninja não obedece regras, desdenha o ponto e vírgula e todos os salamaleques portugueses trazidos pelos herdeiros de Cabral e seus asseclas.

Desprezamos a imagem perfeita e a necessidade de um sinal claro de satélite. Apostamos no mesmo borrão dos impressionistas do século passado e na urgência de acima de tudo dizer o que passa na cidade, na memória dos cidadãos ou no desejo de quem quiser se expressar. Vale tudo. Valem todas as vírgulas e principalmente a ausência delas, pois são todos cacoetes ultrapassados, barreiras reacionárias e de tempos menos aflitos.
Chega das primaveras líricas dos velhos cronistas, libere-se a escrita a quem  queira. Às favas com os parágrafos que se abrem, cobrem cinco linhas, se fecham novamente, abrem em mais cinco linhas e assim vão formando um texto careta e previsível. A partir de agora vai um tijolaço. Hoje não tem revisão, é tudo de primeira e sem o novo dicionário ortográfico ao lado. Chega do culto ao texto burilado, que passou pelo copydesk. A redação está na rua, quebrando todos os parâmetros e metendo a língua aonde nunca foi chamada. A Crônica Ninja prefere o rascunho, os erros de sintaxe e as perplexidades das sensações. Não estamos mais interessados no cronista cheio de certezas, que pensa no que vai falar e trabalha a performance com todos os recursos de estilo. Vazem, otários. Não transmitiremos mais os colóquios de Fernando Sabino. Todo este mundo de clássicos, de câmera firme, imagens definidas, tudo isso ficou velho demais diante do novo modo Ninja de ver as coisas. O sujo, o não policiado, o papo livre, eis os vencedores. Estamos do outro lado do que se acostumou chamar de forças da ordem culta, das leis gramaticais e seus agentes ocultos, P2 que não se sabem mais se sujeitos ou predicados. A Crônica Ninja é a plataforma urgente para flanar nas ruas da cidade, nem aí para a necessidade do autor estar sindicalizado, com a carteira assinada, os impostos pagos ao INSS dos burocratas. ABRIMOS O VERBO E ELE VAI ASSIM, CRU, PARA AS REDES [maiúsculas nossas]. Colocamos as nossas incertezas e novas razões dentro de uma garrafa com qualquer inflamável. Atiramos contra os que querem a limpeza gramatical, vandalizamos a coerência semântica e outras academias mais. É pau, é pedra, é o fim das vidraças, das prateleiras e todos os academicismos da ordem vernacular. Tenho dito. Soltem o Amarildo. Rubem Braga não me representa.»

Fonte: AQUI

quinta-feira, 30 de maio de 2013

Mia Couto – Prémio Camões 2013

 “Eu nasci para estar calado. Minha única vocação é o silêncio. Foi meu pai que me explicou: tenho inclinação para não falar, um talento para apurar silêncios. Escrevo bem, silêncios, no plural. Sim, porque não há um único silêncio. E todo o silêncio é música em estado de gravidez.

Quando me viam, parado e recatado, no meu invisível recanto, eu não estava pasmado. Estava desempenhado, de alma e corpo ocupados: tecia os delicados fios com que se fabrica a quietude. Eu era um afinador de silêncios.”

Mia Couto, no livro Antes de Nascer o Mundo

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