sexta-feira, 13 de abril de 2012

Cadernos de um Caçador

«O leitor talvez já esteja a aborrecer-se com os meus cadernos; vou consolá-lo: prometo limitar-me aos fragmentos já editados; porém, antes de nos despedirmos, não posso evitar dizer algumas palavras sobre a caça.
A caça com espingarda e cão é excelente em si, für sich, como diziam antigamente; imaginemos, no entanto, que o leitor não nasceu com veia de caçador, mas gosta, mesmo assim, da natureza e da liberdade; por isso, não pode deixar de invejar a raça dos caçadores… Oiça.
Sabia, por exemplo, como é delicioso, na Primavera, sair de casa antes de amanhecer? Passamos o umbral… No céu cinzento-escuro cintilam raras estrelas; um ventinho húmido aflui, de vez em quando, numa onda ligeira; ouve-se o sussurro da noite, reservado, incerto; as árvores rumorejam livremente, banhadas em sombras. Agora, põem um tapete dentro da carroça, colocam no fundo dela uma caixa com o samovar. Os cavalos laterais estremecem, bufam e marcam passo com elegância; um par de gansos, acabados de acordar, atravessa silenciosa e vagarosamente o caminho. Por trás da sebe, no jardim, o guarda ressona pacificamente; cada som parece parado no ar imóvel, parado mas sem esmorecer. Sentamo-nos; os cavalos arrancam de imediato, a carroça tamborila… Andamos… passamos a igreja, depois viramos da encosta para a direita, através da barragem… o lago artificial começa a cobrir-se de um ligeiro vapor. Faz um pouco de frio, tapamos a cara com a gola do pacote; mergulhamos em modorra. Os cavalos chapinham sonoramente nos charcos; o cocheiro assobia. Mas já foram feitas cerca de quatro verstás… o horizonte tinge-se de carmesim; nas bétulas, as gralhas de nuca cinzenta acordam e, desajeitadas, voam de um ramo para outro; os pardais chilreiam à beira de medas escuras. O ar clareia, o caminho é mais visível, o céu abre-se, as nuvens branquejam, os campos tingem-se de verde. Nas isbás, as estilhas ardem com chamas vermelhas, por trás dos portões ouvem-se vozes sonolentas. Entretanto, a aurora está a acender-se; já umas faixas douradas se estendem pelo céu, dos barrancos levantam-se vapores; as cotovias desfazem-se num canto sonoro, sopra o vento de madrugada – e o Sol rubro emerge vagarosamente. A luz jorra como um rio; o coração esvoaça no peito que nem uma ave! Frescura, alegria, felicidade! A vista é infinita a toda a volta. Eis uma aldeia por trás do bosque; e ainda outra, mais longe, com uma igreja branca; e uma floresta de bétulas em cima da colina; por trás dela é o pântano, para onde nos dirigimos… Rápido, cavalos, mais rápido! Para frente, a grande trote!… Faltam três verstás, não mais. O Sol levanta-se rapidamente; o céu está limpo… O tempo vai ser óptimo. O gado saiu da aldeia e vem ao nosso encontro. Subimos a encosta… Que vista! O rio serpenteia, estendendo-se por dez verstás, exibindo o seu azul baço através da névoa; por trás dele são os prados de cor verde deslavada; por trás dos prados, as colinas aplanadas; ao longe, os abibes gritam e voam, dando voltas por cima do pântano; através do brilho húmido derramado no ar, o horizonte destaca-se nitidamente… não é como no Verão. O peito respira livremente, os membros movem-se com energia, e todo o corpo, abraçado pelo sopro fresco da Primavera, ganha forças!…»

Tradução e Notas de Nina Guerra e Filipe Guerra
pp. 181-182 da edição portuguesa (Relógio D'Água) 

Ver também neste blogue: Em viagem com Turguénev pela Rússia do séc. XIX



Ivan Turguénev – por Ilya Repin


















Hanna Arendt fala sobre Brecht

Sob o título Homens em tempos sombrios, publicado no Brasil pela Companhia das Letras, Hanna Arendt escreveu algumas coisas luminosas. Como esse trecho de seu ensaio sobre Brecht:

«O que importa, uma vez mais, é o céu, o céu que lá estava antes que existisse o homem e lá estará depois que ele se for, de modo que a melhor coisa que pode fazer o homem é amar aquilo que por um breve tempo é seu. Se eu fosse crítica literária, continuaria a comentar o papel absolutamente importante desempenhado pelo céu nos poemas de Brecht, em especial em seus poucos e lindíssimos poemas de amor. (...) Certamente neste mundo não existe o amor eterno, nem mesmo uma fidelidade comum. Não há nada além da intensidade do momento, isto é, a paixão, que é até um pouco mais perecível que o próprio homem.»



Através da página de Carlito Azevedo no Facebook. 

Os textos reunidos neste livro são biografias comentadas de homens e mulheres que viveram os «tempos sombrios» da primeira metade do século XX. Mergulhando em mundos internos tão díspares como os de Hermann Broch e João XXIII, Rosa Luxemburgo e Jaspers, Isak Dinesen e Bertold Brecht, Heidegger e Walter Benjamin, Hannah Arendt submete a uma reflexão apaixonada, e por vezes implacável, seus erros e acertos, culpas e vitórias, responsabilidades e irresponsabilidades perante a realidade que enfrentaram.
A beleza destes relatos reside na sólida crença arendtiana na solidariedade e dignidade humanas, valores morais ainda capazes de impedir o triunfo do niilismo e do totalitarismo numa época de experiências catastróficas. Companhia das Letras

quinta-feira, 12 de abril de 2012

editoras brasileiras x Amazon

«Aí está algo que editoras americanas não conseguiram, e que fica como mérito de editoras brasileiras. A notícia saiu no jornal Valor Econômico:

“Neste formato, chamado de distribuição, é a própria Amazon que define o preço que será cobrado do consumidor, sem intervenção das editoras. Este valor normalmente é cerca de 50% menor que o preço do livro físico. No Brasil, no entanto, a política de precificação não emplacou.”»


«“As lojas físicas são importantes para as editoras, são uma espécie de showroom para os livros impressos. Não queremos que esta negociação desestabilize o varejo brasileiro”»

Ver mais em http://revolucaoebook.com.br/editoras-brasileiras-dobram-amazon-provocam-mudancas-contrato/

quarta-feira, 11 de abril de 2012

A Permanência da Perda


«Entusiasmo e inteligência é sempre uma combinação estimulante. E foi com essa boa mistura que o colaborador Martim Vasques da Cunha, que alguns talvez conheçam da revista Dicta&Contradicta, escreveu um ensaio iluminador sobre a obra poética de Leonard Cohen. Martim analisa não apenas as famosas canções do bardo canadense, mas também algumas de suas menos conhecidas (mas não menos incríveis) poesias.»

Leia aqui: http://issuu.com/cosac_naify/docs/leonard_cohen_e_a_permanencia_da_perda/1


Através de Cosac Naify: http://editora.cosacnaify.com.br/blog/?p=11284

terça-feira, 10 de abril de 2012

Psico – ficção brasileira


Psico é o segundo romance do jornalista e escritor Julio Ludemir,
ambientado na Rocinha, tida como a maior favela brasileira. É um
thriller social na acepção clássica da palavra, cuja narrativa
frenética revela uma realidade inteiramente nova. À medida que produz
fortes emoções no leitor, o personagem principal da história é a
tradução da juventude classe C que emergiu na primeira década do
milênio como uma resposta generosa às políticas inclusivas do país
reinventado pelo presidente Lula. Uma juventude que interage com o tráfico de
drogas, as igrejas evangélicas, os projetos sociais, a mídia e as
redes sociais, devolvendo tudo com uma subjetividade que os
observadores mais atentos compararão com momentos radiosos da história
mundial, como aqueles que resultaram na revolução jovem da década de
1960.

Através de Livraria da Travessa: http://www.travessa.com.br/Julio_Ludemir/Autor/E3DEA8F4-143D-4923-A6AC-ABF2F39DEE17/eBook/

Outros livros do autor:


sábado, 7 de abril de 2012

books...

do USA Today

design de luxo de Coralie Bickford-Smith (Penguin Books)





http://www.cb-smith.com/index.php?/clothbound/f-scott-fitzgerald/

literatura russa...


«mas o livro é outra coisa»...

«Dos diversos instrumentos do homem, o mais assombroso, sem dúvida, é o livro. Os demais são extensões de seu corpo. O microscópio, o telescópio, são extensões de sua vista; o telefone é extensão de sua voz; depois temos o arado e a espada, extensões de seu braço. Mas o livro é outra coisa: o livro é uma extensão da memória e da imaginação.»

J.L. Borges


Aproveito a frase de JL Borges para dizer que falar em memória é falar também da História, pelo que refiro e recomendo este livro de L. Binet:  http://olivroimpossivel.blogspot.pt/2011/04/laurent-binet-uma-homenagem-kubis-e.html

preciso ler Veronica Stigger

«Trata-se de um livro sobre a baixa estatura moral que preside a relação dos homens, uns com os outros, mas também de sua relação com as coisas, com o tempo e com as instituições. Tem o enorme mérito de fazer tudo isso sem ser moralista, sobretudo porque se desfaz das ideias de bem e mal. Livra-se também da linha dura que separa razão e desatino, como se quisesse trazer para perto de si todas as experiências marginais, tudo que foi apartado do convívio social. Sem preencher de sentido os excessos, Veronica elenca situações e radicaliza as suas consequências ao operar com tipos ideais que expõem com crueza uma série de recalques da nossa sociedade.»
(Thiago Borges de Almeida)


http://editora.cosacnaify.com.br/blog/?p=11547

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