Enquanto - por não querer me adiantar aos editores - não posso comentar livros que revi nos últimos tempos, e que estão no prelo, trago um interessante texto de contracapa da edição da Almedina, Ensaio sobre tipografia, de Eric Gill (1882-1940), designer tipográfico e criador da fonte Gill Sans (a minha preferida...). Objeto irresistível para os aficionados, esta tão bem cuidada edição portuguesa baseia-se na versão fac-similada da editora Lund Humphries, publicada pela primeira vez em 1988.
"O tema deste livro é a Tipografia, e a Tipografia tal como é influenciada pelas condições do ano de 1931. O conflito entre industrialismo & os antigos métodos dos artesãos, que deu origem à confusão do século XIX, está agora a aproximar-se do fim.
Mas embora o industrialismo tenha agora conseguido uma vitória quase total, as artes manuais não estão mortas, & não podem ser radicalmente extintas, porque satisfazem uma necessidade inerente, indestrutível e constante do ser humano.
Os dois mundos podem ver-se, um ao outro, como diferentes e sem recriminações, reconhecendo ambos o que há de bom no outro - o poder do industrialismo, a humanidade do artesanato. Já não há justificação para a confusão de objetivos, incongruência de métodos ou hibridismo na produção; cada um dos mundos pode deixar o outro tranquilo na sua própria esfera.
Que o industrialismo tenha, ou não, 'vindo para ficar' não é questão que nos interesse, mas o artesanato acompanhar-nos-á sempre - como os pobres. E os dois mundos são agora completamente distintos. O trabalho de imitação de 'obras de época' e o comércio do artesanato de imitação estão, por certo, condenados. Os critérios das artes manuais são tão absurdos para a indústria mecanizada como os critérios mecânicos o são para o artesão.
A aplicação destes princípios à feitura de letras e de livros é a matéria principal deste livro."
Ensaio sobre tipografia
Eric Gill
166 pp
Introdução de Luís Ferreira
Tradução de Luís Varela
Revisão científica de Guilhermina Mota
Edições Almedina
Abril de 2003
Outras publicações afins:
Manual tipográfico de Giambattista Bodoni
João Bicker
148 pp
Edições Almedina
2001
A Forma das Letras - um manual de anatomia tipográfica
Maria Ferrand e João Manuel Bicker
66 pp
Edições Almedina
2000
segunda-feira, 17 de maio de 2010
quinta-feira, 6 de maio de 2010
Falando em Turguéniev

O melhor deste livro está na notável diagnose da vida política e intelectual russa de meados do século XIX. Ao menos, é este o nível que me parece mais bem resolvido no livro; não deixa de ser um cenário para a história de amor – que de resto termina muito civilizadamente, sem cataclismos... – que conduz a narrativa, mas um cenário pintado com tintas magníficas pela verve do autor.
«À volta da árvore russa – à l´'Arbre russe – reuniam-se normalmente os nossos simpáticos compatriotas; vinham altivamente, negligentemente, elegantemente, à moda, cumprimentavam-se majestosamente, elegantemente, familiarmente, como compete a seres que se encontram no pináculo da cultura moderna. Mas, depois de se encontrarem, já sentados, decididamente não sabiam o que dizer uns aos outros, e caíam na tagarelice triste ou na fala barata, vulgar, e nas anedotas extremamente impudicas de um ex-literato francês, antiquado, falador e palhaço, com uns miseráveis sapatos judaicos nos pés e uma pequena barba desprezível na face ignóbil.» (p. 8)
Fumo Ivan Turguéniev
216 pp
Tradução a partir do russo e Notas de Manuel Seabra
Relógio D'Água Editores
Lisboa, Fevereiro de 2010
Ivan Turguéniev nasceu em Orel, no Império Russo, em 1818. É considerado uma das figuras mais importantes da literatura russa, ao lado de Dostoiévski e Tolstoi. Oriundo de uma família abastada, passou a infância em Spaskoe, onde conheceu de perto a vida no campo. O seu livro Pais e Filhos (1862) deu origem a grande controvérsia, o que fez com que o autor abandonasse a Rússia. Depois de viver em Baden-Baden e em Londres, fixou-se nos arredores de Paris, onde faleceu em 1883.
Sugestões de Leitura:
Pais e Filhos
Ivan Turguéniev
256 pp
Traduzido do russo por António Pescada
Posfácio de Vladimir Nabokov
Relógio D'Água Editores
Lisboa, Maio de 2007
O Crepúsculo do Amor [sobre a vida de Turguéniev]Robert Dessaix
266 pp
Tradução de José Lima
Oceanos/ASA Editores
Lisboa, Fevereiro de 2007
terça-feira, 4 de maio de 2010
e pensar que, não faz muito tempo, os livros eram compostos assim...
Depois que os Chineses introduziram na Europa o papel e a xilogravura, o caminho para o surgimento da tipografia estava aberto. Do emprego da xilogravura, que data de inícios do século XV, para o procedimento tipográfico foi um passo.
O primeiro objectivo da mecanização tipográfica, além da concorrência com a indústria de manuscritos, era evitar a incidência de erros tal como havia nas reproduções manuscritas, intenção sempre contrariada pelos frequentes e inquietantes acidentes de impressão, de modo que uma página, linha, palavra ou letra podiam sair impressos de forma diferente em exemplares distintos.
Hoje, com todos os recursos proporcionados pela tecnologia informática, esta padronização e qualidade de impressão atingiram o seu mais alto nível, eliminando do processo qualquer vestígio do seu passado artesanal, cujo produto, falível e diferenciado, adquiriu hoje um outro estatuto, de carácter artístico, ocupando um pequeno (mas nem por isso menos importante) nicho num mercado massificado e voraz.
O primeiro objectivo da mecanização tipográfica, além da concorrência com a indústria de manuscritos, era evitar a incidência de erros tal como havia nas reproduções manuscritas, intenção sempre contrariada pelos frequentes e inquietantes acidentes de impressão, de modo que uma página, linha, palavra ou letra podiam sair impressos de forma diferente em exemplares distintos.
Hoje, com todos os recursos proporcionados pela tecnologia informática, esta padronização e qualidade de impressão atingiram o seu mais alto nível, eliminando do processo qualquer vestígio do seu passado artesanal, cujo produto, falível e diferenciado, adquiriu hoje um outro estatuto, de carácter artístico, ocupando um pequeno (mas nem por isso menos importante) nicho num mercado massificado e voraz.
sexta-feira, 30 de abril de 2010
as vending machines

"Livro não é refrigerante" - podem até dizer alguns; mas por que não torná-lo acessível ao máximo, a bom preço e nos locais de grande circulação de público? Foi assim que o grupo LeYa resolveu tomar a iniciativa, com as vending machine: livros a preço único (5 euros) e mesmo à mão dos 'sedentos' de histórias. Está exposta na Feira do Livro de Lisboa, até 16 de Maio. E depois, onde será que as encontraremos?
quinta-feira, 29 de abril de 2010
quarta-feira, 21 de abril de 2010
o desafio da Circlet Press

"I didn’t get into ebooks and place myself on the cutting edge of new book technology because I thought ebooks were really cool and I wanted to be where the action was. No, I was essentially FORCED to become an expert on ebooks or my company was dead in the water. I founded Circlet Press in 1992, way back before a little thing we refer to now as The Returns Crisis."
Na foto: Cecilia Tan, fundadora e editora da Circlet Press
ver mais em: http://www.circlet.com/?p=1024
segunda-feira, 19 de abril de 2010
um português antigo

Recentemente tive a curiosa - e nova - experiência de rever, para uma reedição, um livro de autor português escrito "à moda antiga" - e com isso quero dizer num português com um ritmo muito próprio, marcado não só por uma pontuação bem presente e por períodos longos, mas também por um certo tipo de vocabulário em que tive a surpresa de encontrar palavras que nunca ouvi no dia a dia aqui em Portugal: escangalhado, por exemplo, entre outras. Em geral ouço aqui as pessoas dizerem 'avariado', e cheguei a pensar que 'escangalhado' era um brasileirismo. Isso só me veio recordar, mais uma vez, que no Brasil falamos um português ainda próximo das suas raízes, facto que a maioria dos portugueses nem imagina...
Mas o mais importante aqui é dizer que às páginas pouco numerosas do livro corresponde um texto exigente na sua forma e admirável em sugestões de leitura. "Constitui uma incursão ficcional no período de consolidação do Estado Novo e da mentalidade que ele representou. Está muito longe de ser um libelo político ou uma obra de tese sobre essa época da vida portuguesa, que corresponde ao princípio da queda do império. É, isso sim, uma narrativa muito bem construída, na qual duas personagens centrais, António e Maria, namoram e casam, vindo entretanto a Lisboa visitar a célebre Exposição do Mundo Português, acontecimento emblemático desse período da História nacional." (José Jorge Letria, in Tempo Livre II, Janeiro de 1993)
Mário Cláudio é autor de uma vasta e multifacetada obra que abarca ficção, crónica, poesia, dramaturgia e o ensaio, tendo sido galardoado com vários prémios entre eles o Grande Prémio da Associação Portuguesa de Escritores, o Prémio PEN Clube, o Prémio Eça de Queiroz, o Prémio Vergílio Ferreira, o Prémio Fernando Namora e o Prémio Pessoa.
Tocata para dois clarins
136 pp
3.ª edição
Publicações Dom Quixote
Lisboa, 2010
terça-feira, 13 de abril de 2010
terça-feira, 6 de abril de 2010
por causa do Acordo... ainda!
Desde que li "por aí..." umas pessoas a dizerem mundos e fundos sobre o Acordo Ortográfico, resolvi relançar entre amigos a questão, comentando a dimensão que a coisa alcançou - e com que paixão! E o que pensei que seria uma conversa amena transformou-se em mais um debate acalorado sobre o tema. Enquanto o Acordo não for assimilado, acho que o tema vai ser como futebol em dia de jogo decisivo: é começar a falar e pega fogo logo.
Enfim, depois de muita e muita conversa, que felizmente foi aos poucos amansando, o que ficou foram as dúvidas, ainda tão presentes. Ficámos (ou ficamos?) tanto tempo destacando as diferenças entre "o português de lá" e "o português de cá", que a ficha ainda não caiu: já não há fronteiras??
Brincadeiras à parte, o facto/fato (ambos estão certos em qualquer lado do Atlântico!) é que temos de ler com atenção as novas normas e ficar atentos ao uso da língua no dia a dia (agora, sem hífen); sobretudo nós, revisores, que temos de ser os mais atentos de todos.
Mais que nunca, todo o cuidado é pouco.
Enfim, depois de muita e muita conversa, que felizmente foi aos poucos amansando, o que ficou foram as dúvidas, ainda tão presentes. Ficámos (ou ficamos?) tanto tempo destacando as diferenças entre "o português de lá" e "o português de cá", que a ficha ainda não caiu: já não há fronteiras??
Brincadeiras à parte, o facto/fato (ambos estão certos em qualquer lado do Atlântico!) é que temos de ler com atenção as novas normas e ficar atentos ao uso da língua no dia a dia (agora, sem hífen); sobretudo nós, revisores, que temos de ser os mais atentos de todos.
Mais que nunca, todo o cuidado é pouco.
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